Vivemos tempos em que a ânetworkâ e a âpolĂtica da boa vizinhançaâ se tornaram o padrĂŁo das relaçÔes humanas. Em vez de encontros francos e genuĂnos, vemos cada vez mais conexĂ”es embaladas em sorrisos artificiais, onde a cordialidade muitas vezes Ă© sĂł mĂĄscara. O resultado Ă© um mundo onde se aperta a mĂŁo com elegĂąncia, mas se guarda a mordida em silĂȘncio, um convĂvio Nutella, bonito por fora, mas vazio de raiz.
Esse modelo superficial nĂŁo se limita ao campo das amizades: invade as relaçÔes de trabalho, de negĂłcios, familiares e atĂ© amorosas. A lĂłgica da aparĂȘncia e da conveniĂȘncia substitui a sinceridade, deixando pouco espaço para vĂnculos verdadeiros. Ă como se tivĂ©ssemos aprendido a priorizar a embalagem em detrimento do conteĂșdo, reproduzindo, no cotidiano, a mesma lĂłgica que criticamos nas fake news: aquilo que parece real, mas nĂŁo Ă©.
Nessa engrenagem, o que mais se perde Ă© a essĂȘncia do humano. A vida compartilhada deveria ser um campo de apoio mĂștuo, nĂŁo de sabotagem disfarçada de cordialidade. O verdadeiro trabalho humano estĂĄ em nĂŁo levantar barreiras contra o caminho do outro, mesmo quando nĂŁo hĂĄ afinidade. Afinal, a vitĂłria de alguĂ©m, vista de pĂ©, pode se tornar tambĂ©m um aprendizado coletivo.
A sinceridade dos atos, quando brota do coração, nĂŁo precisa de palco nem de artifĂcio. Ela se sustenta sozinha e encontra seu lugar natural no tempo de Deus. O desafio, portanto, Ă© resistir Ă tentação do verniz fĂĄcil das aparĂȘncias e resgatar a profundidade dos vĂnculos. Porque sĂł na verdade, ainda que difĂcil, Ă© que a humanidade avança.
Vivemos a era da Nutella social: tudo parece ter sabor, tudo parece ser bonito, tudo parece acolhedor, mas pouco alimenta a alma. Falta substùncia, falta verdade, falta presença.
O progresso que se exibe nas vitrines tecnológicas não reflete maturidade emocional nem avanço coletivo. Seguimos conectados, mas carentes; cercados de contatos, mas distantes de comunhão. E enquanto as relaçÔes se tornam espetåculo, a humanidade se esvazia do seu propósito mais sagrado: ser ponte, não palco.